sábado, 22 de outubro de 2011

A carne é da lata

A carne é da lata
Técnicas para conservar e manter 
a qualidade dos alimentos

23/11/2009 - 16:31

por: Eulâmpio Vianna


   

A desidratação, a refrigeração, salga e a defumação são as maneiras de conservar mais
 antigas, algumas ainda dos tempos das cavernas. 

Técnicas para manter a integridade dos alimentos, surgem com a necessidade de 
sobrevivência humana. Observando e imitando a natureza que aprendemos.


A prática de secar ao sol e ao vento começou com a percepção de que, algumas
 frutas e verduras, mesmo depois de secas, ainda podiam ser consumidas.

 O frio do inverno foi importante, embaixo das nevascas, restos de animais mortos
 eram reaproveitados. Hoje o processo é o mesmo, o que mudou foi a tecnologia. 

A história conta ainda, que a carne defumada, muito apreciada pelos brasileiros, 
surge quando os moradores das cavernas penduravam as carnes em locais próximos
 ao fogo, uma maneira de evitar que outros animais fossem atraídos pelo cheiro da carne.
 Sem contar que a preocupação maior, era com a própria vida. 
O fogo e a fumaça afastavam grandes animais.


O que eles não sabiam é que a fumaça também os protegiam dos micro- organismos.
 Uma capa protetora envolve a carne, cria substâncias antimicrobianas, e evita a 
atividade de bactérias nocivas.

O sal foi por muito tempo, o mais importante meio de conservação. 
Tal a sua importância que foi moeda de negociação por séculos. 
Usado pelos egípcios e gregos, o sal além de bactericida, acelerava o processo de 
desidratação dos alimentos.

    

A conserva se sofisticou, ervas e temperos foram adicionados, alguns para auxiliar como conservante, outros como bactericida e anticéptico e muitos para contribuir no sabor e, principalmente, o aroma. 

São esses aromas que os grandes chefes estão exploram. 

É o caso da carne serenada, um filé de alcatra salgado com sal grosso e estendido durante 
toda a noite no sereno. No dia seguinte, o sal é retirado e a carne é assada na brasa.


Outra técnica é a carne fumada, mais trabalhosa, mas muito saborosa.
 Em uma panela, é colocado um tição em brasa, por cima cascas de arroz, folhas 
e galhos de ervas.

 Na boca de uma grelha, onde a carne é colocada, vai outra panela de boca para
 baixo para abafar e fazer fumaça. 

Depois de dez minutos, a carne é virada e mais dez, para o outro lado.
 Daí é só tirar e grelhar. 

Eu mesmo uso essa técnica para fazer um bom rosbife ou um patê de salmão fumado.

“Confit” ou, em bom português, carne na lata

   

Existe mais uma técnica muito famosa na cozinha mundial e comum para nossas avós. 
É a carne na lata, para os franceses, “Confit” (carne cozida na própria gordura). 

Essa forma de conservar veio para o Brasil com os portugueses, muito usada nos 
tempos de colonização.


A carne é cozida em banha até que toda água se evapore. 
A água é um meio de propagação para bactérias, em temperaturas propícias, se desenvolvem rapidamente e contaminam o alimento. 
Isso serve para qualquer tipo de conserva.

Em Sacramento, no Triângulo Mineiro, a cozinheira de mão cheia, Vera Lúcia Oliveira, 
faz questão de “conservar” essa tradição. Sua especialidade é a carne recheada 
e acondicionada na lata.

 “A preparação é de véspera. 
Um dia para o tempero pegar e outros 15 dias para que a carne adquira um sabor bem característico”, ensina Vera.

   

A cozinheira usa uma peça de coxão duro ou lagarto, cerca de dois quilos.
 O recheio é com carne moída, meio de carne bovina e meio com carne de porco (pernil), 
mas pode ser linguiça também. 

Com um martelinho de cozinha, são amassados 4 dentes de alho, 4 grãos de pimenta comari 
e sal a gosto. Vera mistura tudo com as mãos: “melhor assim, nada de máquina, como minha
 mãe fazia”, explica a cozinheira.


Um buraco é feito na carne para colocar o recheio, mas sem perfurá-la. 
A massa de tempero é espalhada no recheio e por toda peça. 
A carne, recheada, e coberta com um pano para descansar. 
Após duas horas, vai para a geladeira até o dia seguinte.

   

Depois de 12 horas, a carne vai pra panela e é dourada em 2 colheres de banha de porco. 
A mineira Vera cobre a carne com 3 litros de banha e mais 1 litro de água e, quando entra
 em fervura, baixa o fogo. 
A carne fica pronta depois de 5 horas. “No fogão a lenha, eu conheço todos os barulhos.

Eu descubro que a água da banha já saiu, quando jogo um pouco do óleo na brasa, se chiar 
é porque ainda não evaporou toda água, se só sair fumaça é que já está pronto.
 Isso também foi minha mãe que ensinou”, comenta.

A carne é colocada em uma lata, do mesmo modo que os antigos tinham para guardar os alimentos. 
Vera aperta bem a carne e por cima põe a banha do cozimento até cobrir. 
Depois ela tampa a lata e deixa em local fresco, sem luz.

  

E pra quem conhece o que Vera Lúcia está dizendo, ou se lembra do cheiro da carne
 na banha servida em fatias, sabe que ela tem razão.


Vera corta a carne em fatias e frita até que a gordura derreta e a carne fique quente. 
 Se o cheiro é inesquecível, o sabor -pra mim que comi pela primeira vez- é surpreendente.

Na procura pelo novo, a cozinha é um dos poucos lugares que viaja nos dois sentidos: 
passado e futuro. O amanhã é de constante evolução em equipamentos, mas apreciamos
 na nossa história uma essência muito bem “conservada”.

http://eptv.globo.com/terradagente/NOT,0,0,278308,A+carne+e+da+lata.aspx

Nenhum comentário:

Postar um comentário