O tipo de beringela cultivada no Brasil é diferente da cultivada nos outros países. O porquê de plantarem beringela amarga no nosso país, isso ainda não descobri.
O fato é que mesmo tendo desenvolvido uma certa simpatia pela beringela na França, graças à ratatouille (o prato, não o rato), ela continuava lá no final da minha lista de legumes preferidos.
Até que vim pra cá e minha relação com beringela nunca mais foi a mesma. Pastas à base de beringela são comuns em vários países do mundo, mas cada lugar tem seu método de preparação e temperos próprios.
Aqui no Oriente Médio eles assam beringela no forno e, dependendo do lugar, acrescentam alho, cebola, sal, cuminho, azeite e/ou tahina e chamam a preparação de “baba ghanoush”. Na Palestina a receita é muito parecida mas o nome muda: aqui pasta de beringela é chamada de “mutabbal”.
A receita do melhor mutabbal que já provei me foi dada não por uma palestina, mas (pasmem!) por uma alemã. Conheci Johanna em 2007, quando vim passear por essas terras pela primeira vez. Um dia ela colocou na mesa um prato de mutabbal que me deixou pra lá de impressionada.
Ela aprendeu a prepará-lo com um amigo israelense e desde então é a única receita de mutabbal que entra na minha cozinha. Hoje Johanna é uma das minhas melhores amigas e tenho certeza que o sentido cósmico do nosso encontro foi introduzir mutabbal na minha vida.
O segredo pra fazer um mutabbal de cair pra trás está na maneira de preparar a beringela. A grande maioria das pessoas gosta de assá-la no forno, o que é totalmente aceitável mas que produz um resultado menos espetacular.
O mutabbal cinco estrelas é feito com beringelas assadas diretamente na chama do fogão. Assim elas vão adquirir um delicioso sabor defumado e vão te dar vontade de nadar em uma piscina de mutabbal. Juro.
Os temperos também têm um papel importantíssimo. Eu sou uma purista do mutabbal e na minha receita só aceito tahina, suco de limão, alho, sal e pimenta do reino. Tive a infelicidade de cruzar com um pseudo-mutabbal, preparado com (sacrilégio!) maionese.
Algumas receitas usam cominho mas, embora eu adore cominho em outros pratos, o sabor forte dessa especiaria acaba não sendo feliz ao lado do defumado da beringela.
Mesmo se você não for fã de beringela, dê uma chance a esse patê. Escolher beringelas de ótima qualidade vai ajudar a diminuir o amargor e no final o sabor defumado e os tempeiros vão acabar dominando. Confie em mim, eu sou uma especialista do mutabbal.
Mutabbal (patê de beringela palestino)
Use as melhores beringelas que encontrar. Uma boa beringela é firme, lisa, brilhante, sem manchas, amassados ou furinhos. Os furinhos indicam que ali tem bichinho, enquanto que uma casca opaca significa que há grandes probabilidades da beringela estar amarga .
Como expliquei no texto acima, usar a chama do fogão pra assar as beringelas vai fazer o patê passar de “gostoso” pra “espetacular”, mas se você só tiver um fogão elétrico pode usar o forno. Mas não deixe de experimentar a versão defumada pelo menos uma vez (em um churrasco, talvez?).
O modo de preparo parece longo porque detalhei bastante o método de preparação da beringela, mas na verdade esse patê é simplérrimo de fazer.
1 beringela média/grande (1x de polpa, depois de assada)
1 dente de alho pequeno ralado (ou pilado)
3cs de tahina
2cs de suco de limão
uma pitada de pimenta do reino
sal a gosto
Lave e seque a beringela inteira. Coloque-a diretamente sobre a chama do fogão e deixe assar, virando de vez em quando pra assar uniformemente de todos os lados, até a casca ficar completamente carbonizada.
Eu sempre escolho uma beringela que tenha um cabinho longo e, segurando o cabinho entre os dedos da mão esquerda e com a ajuda de uma colher na mão direita, viro a beringela de 5 em 5 minutos, até todos os lados ficarem assados.
Coloque a beringela na maior boca do seu fogão, pra dar mais equilíbrio e impedí-la de cair, e asse-a em fogo alto. Não seja tímido, quando digo que é pra assar a beringela até ela ficar completamente carbonizada não estou exagerando: a casca tem que ficar preta e quebradiça.
Ao ser manipulada, pode ser que a casca se rompa em alguns lugares e um pouco do líquido da beringela escorra, fazendo uma sujeira danada no seu fogão.
Não tem problema, continue assando até ficar totalmente queimada em todos os lados. Pra saber se a beringela está pronta enfie uma faquinha fina no centro: a polpa tem que estar ultra macia e, depois de furar a casca queimada, a faca tem que deslizar com muita facilidade.
Se for preparar a beringela no forno, coloque-a inteira diretamente sobre a grelha e asse até a casca ficar chamuscada e a polpa ficar bem macia (use a faca pra testar). Depois de assada, transfira a beringela pra uma táboa de cortar legumes e deixe esfriar durante 5 minutos.
Nesse ponto sua beringela vai estar horrorosa e você vai achar que estragou a receita mas não se desespere. Embaixo da casca chamuscada você encontrará uma polpa macia e deliciosamente defumada (veja fotos mais embaixo).
Segure a beringela pelo cabinho e corte-a ao meio, no sentido vertical. As duas metades vão ficar presas somente pelo cabinho. Corte o topo da beringela, separando as duas metades (ver foto).
Com uma colher, retire cuidadosamente a polpa da beringela e coloque em um recipiente pequeno. Se alguns pedacinhos de casca queimada se misturarem à polpa não tem problema.
Junte os outros ingredientes (comece com 1/3cc de sal e acrescente mais depois, se preciso) e bata com um garfo até a polpa da beringela virar purê, se misturar com os outros ingredientes e se transformar em uma pasta homogênea.
Prove e junte mais sal, se necessário. Sirva com torradinhas. Eu gosto de espalhar uma camada generosa de mutabbal em uma fatia de pão integral ligeiramente grelhado e colocar tomate e pepino picadinho, temperados com sal, suco de limão e salsinha, por cima.
Pode ser servido como entrada, aperitivo ou até mesmo como um almoço/jantar leve. Se conserva alguns dias na geladeira, em recipiente fechado, mas é bem melhor quando degustado logo depois de ter sido preparado. Rende 1x.
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